quarta-feira, 9 de setembro de 2015

POETISA SERGIPANA "ILDA REZENDE "


   BIOGRAFIA

Ilda Rezende nasceu em Porto da Folha-SE, em 05 de dezembro de 1937. Cultiva o gosto pela literatura desde a infância, quando fazia suas anotações de viagens e férias escolares, além de colecionar cadernos de poesias. Participou de várias coletâneas e orgulha-se de ter começado nas oficinas literárias coordenadas por Iara Vieira e Maruze Reis. Este Cama de Vento, primeiro livro publicado agora na maturidade, teve seus registros iniciais nos exercícios dessas oficinas. Da infância em Itabi-SE, a dona de casa e mãe de seis filhos, guardou o lirismo e a simplicidade marcas de sua poesia.

Sobre o livro Cama de Vento Maruze Reis diz assim: “A poeta parece compor um calendário de humanidades. Cama de Vento é um livro que faz um registro emocionado do tempo. Sua poesia recupera sinais e marca “ Algo mais além\Das horas”: Insônia, solidão, alegrias e perdas. Um aglotinado harmonioso de versos cujo o canto é mais da vida que das horas desse inexorável relógio do tempo. Há o tempo das varandas e casas de platibandas; há o tempo do amor, há o tempo em que “as chaves são adornos”; há o tempo...há poesia.
Sobre a poeta diz Ronaldson Sousa: Ilda Rezende dá um toque especial à existência por registra-la em flagrantes cândidos, pelo veio e verve de sua poesia simples e autêntica: dela, podemos perceber o quanto pode a arte literária expandir e enriquecer o universo vivencial de todos nós.

ALGUMAS POESIAS DE ILDA REZENDE

É madrugada
O nascer do sol
Enche de energia
O peito dos pardais.
As baratinhas silenciosas
Rastejam-se no chão da cozinha
À procura de miolo de pão
É madrugada.
Nem todos dormem.
O poeta mergulhado na imaginação
Volta de mãos vazias:
Nem peixes
Nem escamas
Nem facas


DE CECÍLIA

O livro de bolso
E Cecília na capa
Sorrindo
Serena
Olhar bonito
Olhando-me
Acho que ela
Quer me dizer
Entre nessa
Venha ser poeta
Poesia é ter lápis e
Papel na mão e
Escrever versos. Versos
Que brotam como canção:
“Pus meu sonho no navio
E o navio em cima do mar...”
NO CLOSET
Cabides vazios
Gavetas abertas
Choram a tua ausência.
BANHO DE LUA
A lua se banhando
No mar
É impossível
Não olhar
-------------------------
Não tenho segredos
As chaves são só adornos
-------------------------------


A TELA

A Hortência Barreto
Da tela multicolorida
Fiz o portal dos meus sonhos.
Deram-se as mãos,
As bonecas
Da cor do arco-íris
E assim, de mãos dadas
Fomos passeando
Pelo encantado mundo
Até chegar à calçada alta de lajes
Só pra ler poesia.
ARCO ÍRIS DE BONECAS
Deflagrado
Na tela
Os sete sonhos
De minha
Infância


RECADO

Diga a Aracaju
Que sinto saudades (dela)
Principalmente
Da Coroa do Meio
O mar batendo nas pedras
Invadindo as ruas
(E meus pensamentos)
Sinto saudades
Das cabanas na praia
Das manhãs de caminhadas
Onde descansava
As pernas
Nas cadeiras de tábuas
(Frágeis cadeirinhas...)
Sinto saudades
Dessa areia grudadinha
Que cola no corpo inteiro
E tem brilho de purpurina
Sinto saudades
Do por do sol
Quando as tartarugas (preguiçosas)
Vinham lentas
Nas ondas do mar
Dizer:
Até outro dia!

POETA SERGIPANO "EZIO DÉDA"‏


 
BIOGRAFIA DE EZIO DÉDA


Natural de Simão Dias -SE, Ezio Déda é arquiteto e escritor. Em 2001, lançou o livro de poemas Árvores de Folhas Caducas,apresentado por Maria Bethânia. Foi coordenador dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e de Design de Interiores da Universidade Tiradentes durante o período 2004\2009,ocupando,atualmente a cátedra de Projeto de Arquitetura. Em 2008,fundou o Ágora Arquitetos Associados. É o arquiteto responsável pelo projeto do Museu da Gente Sergipana, juntamente com a equipe do Àgora. O projeto foi vencedor do Prêmio Nacional "O Melhor da Arquitetura", na categoria restauração. É autor do livro em multimídia A Casa das Ausências, obra que mescla poesia,dramaturgia,desenho e música,contando com as participações de Antônio Abujamra, Jorge Mautner, Maitê Proença, Jorge Versíllo, Teresa Rachel, D. Canô, Arildo Déda, Marcelo Déda, Arttur Déda, e e Expedita Ferreira e Zélia Ducan. Atualmente, exerce a função de Superintendente do Instituto Banese, que possui ações voltadas para a cultura e responsabilidade social . É Conselheiro da Editora do Diário Oficial do Estado de Sergipe.

-SE

Quando chegou a primeira
ausência
Ainda vivia no verdadeiro
tempo das coisas
Cotidiano de minhas esperas
Mas vieram tantas outras
Que aprendi a morar na
antecedência do destino
Eu existi na véspera da vida


-----------------
Atrás de toda felicidade
Há sempre um luto em
silêncio
Uma renúncia que acena
ofegante pela vidraça.
Por quantas impossíveis
geografias
Ainda permaneceremos
exilados na fronteira do equívoco
Mesmo nos sabendo
vizinhos de terras
devolutas?
-------------------------
Nasci através de mãos
laicas
Fui recebido sem anestesias
E o eco veio inaugurando a
manhã do quarto que chovia
Era a alegria pura, sem
precedentes ou expectativas
Era a saúde empírica de
toda família
Estou vivo como o vento
das águas revoltas
No necessário
desassossego de minha
natureza.
----------------------------------
A lucidez me vem como
gota amarga
Se molha a porção que
escorre da naturezas dos
telhados
O líquido que sorvo é incolor
inodoro e insípido
Mas nunca é agua pura.
--------------------------------
Trago no dom o
insustentável traço da sina
De ser eu mesmo a letra que me aniquila.
-----------------------------------------------
Meu texto é veículo de
busca
Não esteta da língua que me
decifra
E expõe ao exílio
No vasto latifúndio baldio da América do Sul.


PROSADORES DEVEM LER POESIAS? - Antonio Carlos Mangueira Viana

PROSADORES DEVEM LER POESIAS?


Já ouvi algumas pessoas dizerem que quem escreve prosa deve ler sobretudo os prosadores para aprender com eles como narrar, descrever, contar uma história. Quem escreve poesia deve ler os grandes poetas e assim aprender com eles como se faz um bom poema. Assim, quem escreve contos só deve ler os contistas; quem escreve crônica, só os cronistas... Tudo seria muito pobre se assim fosse. Eu sou um inveterado leitor de poesia, que vive correndo atrás do que vêm publicando tanto velhos quanto novos poetas. Creio que devemos ler tudo o que nos ajudará a desenvolver melhor o nosso ofício.
E o que a poesia tem a dar a quem trabalha com prosa? Primeiro: o ouvido. Educar o ouvido com os poemas de uma Cecília Meireles, de um Drummond, de um Bandeira, e mesmo com o metálico João Cabral, é ficar atento ao mínimo ruído que perturba a frase. Segundo: o ritmo. Um bom texto, seja ele em prosa ou poesia, precisa ter ritmo. E nada ensina mais o que é ritmo do que um bom poema. Preste atenção na cadência das palavras, nas rimas (se houver), na sequência dos sons. Há prosa mais cadenciada do que a de Guimarães Rosa? Terceiro: a escolha das palavras. Com a poesia, aprendi que o ritmo nasce de uma sequência de sons que nos roubam o ouvido. No meu trabalho, muitas vezes fico procurando uma palavra que caiba em determinado fragmento de frase só para criar um ritmo capaz de lhe dar uma cadência. E isso leva até meses para encontrá-la.
Há livros que a gente lê sem nenhuma dificuldade, que fluem como água clara escorrendo suavemente. Há outros que parecem feitos a martelo, um rio de cheio de pedregulhos, um obstáculo a cada frase lida. Por que alguns autores nos conquistam logo de saída e outros não? A resposta está no ritmo, na cadência das palavras, nos sons que se combinam, no ouvido que o escritor apurou para transmitir ao leitor o melhor de sua prosa. A poesia me ensinou muito e ainda me ensina. Antes de procurar o sentido de um poema (muito cuidado com isso!), estenda seu ouvido aos sons que ele agencia, ao ritmo que nele predomina, às palavras que aparecem no seu corpo em lugar de outras que seriam seus sinônimos. Ler o poema com as palavras ausentes diz muito mais de sua fatura do que ir ao dicionário em busca de um sentido para elas.




ANTONIO CARLOS MANGUEIRA VIANA

CONTO OU CRÔNICA? - Antonio Carlos Mangueira Viana

CONTO OU CRÔNICA?


"Pergunta recorrente em minha vida de escritor: você escreve contos ou crônicas? Claro que contos, não sei escrever outra coisa. Sempre respondo que o conto se lê na vertical, a crônica na horizontal (não confundir com outras posições do gênero). No conto, você mergulha quase sempre numa história de alta voltagem, que deve arrastá-lo até o final, sem trégua. Já a crônica é como um passeio por um parque, você começa e vai até o fim sem nenhum sobressalto. Não há preocupação com a densidade psicológica das personagens, isto é, quando se trata de crônicas com personagens. Geralmente ela fala de um fato banal do cotidiano, mas nem por isso ela é banal. É tão difícil escrever uma boa crônica quanto escrever um bom conto. Quem quiser que pense.
O conto deve nos arrastar desde as primeiras linhas para um final nunca dado antecipadamente. Se isso acontecer, o contista fracassou. Surpreender o leitor, eis a sua máxima. Dizem que o bom conto só se resolve mesmo nas últimas linhas. Se for a última palavra, melhor ainda. Mas aí é preciso dominar mil artifícios. As personagens vão se delineando pouco a pouco na mente do leitor, nunca nas primeiras linhas como na crônica. Nesta, elas são dadas com toda clareza, pois o gênero é para ser consumido rapidamente, ninguém vai ficar o resto do dia pensando na crônica que leu no jornal durante o café da manhã. Já o conto, mesmo depois de terminada sua leitura, as personagens ou os fatos podem ficar nos perturbando por horas, dias, meses, quando não anos. Quem nunca leu "A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa, leia que vai me entender.
Mário de Andrade dizia que o bom conto é aquele que, ao final de sua leitura, deixa o leitor com o olhar perdido no horizonte.
Espero ter esclarecido de forma sucinta as diferenças entre esses dois gêneros de tão difícil tessitura."






ANTONIO CARLOS MANGUEIRA VIANA

O RESPEITO À LÍNGUA - Antonio Carlos Mangueira Viana

O RESPEITO À LÍNGUA
 

Foi Clara Angélica quem tocou no assunto, dizendo que tanto aqui, no Brasil, quanto lá, nos EUA, onde ela mora, o desrespeito à língua é comum. Foi isso que entendi. Se não, que ela me corrija, por favor.
Em tempos de mensagens rápidas, é normal que a gente tenha preguiça de acentuar (eu mesmo tenho), de escrever a palavra inteira (quando posso, a reduzo ao essencial), de escrever frases com começo, meio e fim (isso evito). Afinal o meio é a mensagem, já nos dizia um dos papas da comunicação do século que deixamos para trás faz pouco tempo.
O respeito à língua vai muito além disso. Nessas comunicações diárias, quando a pressa é quem manda, acho normal fazermos supressões. O grande problema está em quem faz isso com consciência e quem não o faz. É como dizem de Picasso. Para ele desconstruir a figura, antes aprendeu a fazê-la com todos os detalhes. Quem já viu seus desenhos minuciosos entenderá isso facilmente. O mesmo podemos dizer de quem desconstrói a língua por sabê-la demais. Ninguém chega a fragmentar bem uma frase se não aprendeu como estruturá-la perfeitamente.
Chegamos então ao ponto crucial da questão: o nosso ensino é uma lástima. Antes de aprender a escrever uma frase perfeita, o adolescente já escreve frases caóticas e continuará assim porque a escola não se preocupa com os meios que ele utilizará em sua vida para se comunicar. Aí entra aquele amor à língua que aprendemos no passado com professores que não podiam ouvir um "pra mim fazer" sem se arrepiar. Não vou ficar lamentando o presente em relação ao passado. Apenas detecto que há muito se perdeu o amor à língua, à linguagem. É triste ver mesmo pessoas que querem ser escritores sem o mínimo domínio da gramática e da linguagem. Daí os textos cheios de clichês ou de criações linguísticas de mau gosto. Sou dos que ainda se arrepiam com um "lhe vejo amanhã" . Na linguagem cotidiana, tudo bem, ninguém vai ficar gastando regência numa simples despedida, mas, se gastar, nada contra. Num texto coloquial, tudo é questão de adequação.
E de onde vem tanto desamor à língua. Sinal dos tempos, diriam alguns, quando ninguém se preocupa com miudezas como "lhe amo tanto!". Para respeitar seu idioma, e por extensão a própria pátria, só mesmo uma boa educação. "Minha pátria é minha língua", canta Caetano o verso de Pessoa, para poucos ouvidos.



ANTONIO CARLOS MANGUEIRA VIANA

O SIMPLES E O SIMPLÓRIO - Antonio Carlos Mangueira Viana


O SIMPLES E O SIMPLÓRIO



Quem já leu "Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, vai entender do que estou falando. Se você ainda não leu, vá correndo pegar seu exemplar em qualquer livraria. Quando li esse livro pela primeira vez, fiquei matutando como alguém, usando as palavras mais comuns do mundo, criou uma obra de tanto impacto e que ficou para sempre em nossa literatura. O livro é escrito de forma simples, sem recorrer a malabarismos frasais, a palavras escalafobéticas, numa linguagem limpa, transparente, que atinge qualquer leitor.
Mas como escrever de forma simples?, eis a questão. Quem pensa que é fácil se engana. O estilo simples é o resultado de muitas horas, dias, meses, e até anos, do trabalho de um escritor diante de seu texto, limpando-o de todas as excrescências, dos clichês, das palavras que atropelam a frase e, por consequência, a leitura.
Há livros que nos pegam de vez e só largamos ao fechar a última página. Quando você ler um livro (pode ser agora), observe se a leitura escorrega fácil por seus olhos e ouvidos (aqui entra o ritmo, do qual já tratei neste espaço).
Quem começa a escrever pensa que é usando palavras difíceis que o texto atrairá a atenção do leitor. Grande engano. Nenhum leitor quer ser importunado com um palavrório que necessita de um dicionário ao lado. Ele procura uma distração, e o livro não deve pesar em suas mãos. A leveza é uma das características da boa obra literária (Calvino). Texto que começa a pesar desde a primeira página deixa o leitor impaciente. Há pessoas que adoram escrever difícil, como se isso fosse sinônimo de obra complexa.
O mesmo ocorre com a poesia. Como, de palavras tão triviais, extrair chispas poéticas capazes de extasiar o leitor. Todo o X da questão está não nas palavras, mas na forma como elas se combinam. E aí o escritor tem de ser impiedoso consigo mesmo. Não deixar passar nada que roube a simplicidade de suas frases, de seu texto. Deve estar atento à combinação das palavras, não colocando qualquer uma delas só porque a considera bonita. Neste caso, saímos do estilo simples e caímos no simplório. Há textos que nos dão pena de tão pobres que são em termos de linguagem.
Há quem fique se perguntando: que diabo de linguagem é essa, de que os críticos tanto falam? É aquela capacidade de um autor saber se elevar do nível mais comum da combinação das palavras cotidianas e alçar um patamar estético (com elas e apesar delas) capaz de nos emocionar. É na combinação das palavras, da sequencia das frases, que sentimos o pulso do bom escritor.
Os simplórios se contentam com tudo que dizem ou escrevem. Os que procuram a simplicidade nunca dão o trabalho por terminado. O livro só termina mesmo porque o editor coloca um prazo e dele não abre mão, porque, se abrir, vai esperar ainda alguns anos. O bom escritor dificilmente se dá por satisfeito com o que produziu. Sejamos simples, nunca simplórios.



ANTONIO CARLOS MANGUEIRA VIANA